Sempre fui magra.
Por muito tempo, época essa que lembro com certa
melancolia, não me importava com o que escolhia comer.
Me lembro da batalha do leite, em que, para
sanar meu sofrimento – e deixar minha mãe satisfeita – era preciso fazer milk-shake as 6hs da manhã, garantindo o seu consumo. Lembro também de polvilhar canela e açúcar cristal na
banana em rodelinhas que eu comia na casa-da-vovó e que o requeijão era
consumido a colheradas como se fosse iogurte.
Dentre as memórias das tardes de inverno, quentinha, nas calças de flanela, me divertia assistindo as manchas de gordura que dançavam no chá... Apareciam toda vez que eu mergulhava o biscoito waffer. Sem nem me dar conta, lá se ia metade do pacote...
Para mim, bolinho de chuva tem gosto de férias de verão na
praia e brigadeiro de colher das tardes brincando de boneca.
Biscoito traquinas de morango, era o meu lanche preferido no
colegial e, nesta mesma época, quinta-feira era o dia de pizza de catupiry com
milho e Coca-cola!
Veja bem, antes de qualquer julgamento, que a verdade seja
dita: sempre comi bem – não muito, mas bem. Nunca dispensei salada (da alface à
alcaparra), nem legumes cozidos (do chuchu ao jiló – verdade mesmo!), nem as frutas (do
caju ao cajá), o pão integral, o queijo fresco, as castanhas e blá, blá, blá...
Na minha lancheira da escolinha, eu levava ervilha seca e pistache,
mas não negava um bolinho Ana Maria. Mais interessante, nunca fui forçada a
nada, sempre realizei as minhas escolhas de modo natural... Osmótico até.
Pois bem, hoje, quando considero as escolhas alimentares
(deles, delas e minhas... ) – para além do mero oficio, pois acho
impossível separar a pessoa do profissional que se é – me entristeço (como
eufemismo para “me desespero”).
O que é isso que
fazemos com “a dieta”? Que história é essa de “vestir” um corpo? Será que isso
sempre existiu, só eu que não tinha reparado? Aonde será que foi parar a nossa
liberdade de consumir algo “apenas” pelo prazer? Sem pensar em absolutamente
nada a não ser seu paladar?
Adoro minha profissão, sou absolutamente convicta de que não
existiria outra que me caísse tão bem. Sou muito feliz com as conquistas que
ela me proporciona, mas... Cá entre nós, tenho uma saudade enorme de quando eu comia
um pedaço de bolo de laranja e, tudo bem, se eu quisesse mais um, era só ir até
a cozinha pegar outro. Simples assim.
Mais ainda, tento, a cada dia, a cada consulta, a cada
artigo, a cada aula ministrada, reforçar (e talvez para mim mesma) que nutrição
– e, pasme, até mesmo a nutrição estética – não deve ser sinônimo de um corpo lindo
que, no entanto, mantém refém uma alma insatisfeita.
Que Papai do Céu me proteja e não me deixe ser um agente facilitador
da falta de liberdade, que limita o corpo e, mais ainda, o pensamento.
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