quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Nada mais que um reflexo!

Com o coração mais aberto, não me envergonho em dizer que é muito difícil eu ser veementemente contra - de modo ríspido - algum tratamento. 

Observem aqui pelo meu lado. Trabalho com a alimentação e a nutrição do outro. Não a minha mesma. Diariamente ajusto o que o outro deve ou deve não consumir e, até mesmo, como deve ser feito aquele consumo. No final de cada dia, em que eu estou tranquila realizando meu jantar, nem lembrando de um ou de outro paciente, o referido, no entanto, está a consumir aquilo que eu, de alguma forma o determinei

Muito complicado. Uma invasão enorme. 

A ciência muito nos explica, mas não consegue ajustar o paladar, nem sempre é enfática nas melhores escolhas e, honestamente, a falta de educação alimentar (cultivada pela família) de nada ajuda as opções e os gostos de nossos jovens e adultos. 

Mesmo assim, quem sou eu para determinar o que o outro vai consumir?

Ok.
Devo ter mais propriedade para discorrer sobre o assunto, visto a minha formação, a minha prática diária e o meu interesse. Mas, acreditem vocês, não é tarefa fácil... E a pior das respostas a um nutricionista é aquela que vem seguida do desânimo e na tristeza alimentar de seu paciente que perdeu a graça nas suas refeições.

Esta semana, o G1 publicou uma matéria - cuja manchete é brutalmente sensacionalista - sobre uma jovem que, por conta própria, iniciou um "regime" em que suas refeições principais (almoço e jantar) eram os queridos-shakes-substitutos-de-refeições. Como viu "resultados", continuou com o seu "regime" por 8 meses e "perdeu"  13kg. Seu objetivo era estar "em forma"  para o carnaval. 
Até aí, nada de muito surpreendente. 

No entanto, o que a jovem acabou experienciando foi a perda momentânea da acuidade e do controle dos movimentos das pernas. Isso aconteceu pela falta de uma vitamina bastante comum de ser encontrada na alimentação (carnes, peixes, oleagenosas, gema do ovo, cereais...), que não se é necessária para além de 1,5mg/dia - acredite, em uma alimentação, mesmo que desbalanceada, se consegue atingir essa pequena quantidade. Acontece que ela não estava "se alimentando".  

O efeito da Tiamina no corpo, no entanto, é muito importante. Dentre suas funções de conversão e uso de energia, essa vitamina está envolvida com a saúde do sistema cardiovascular e nervoso. Não à toa, a sua carência leva ao Beribéri, doença relacionada à condições gástricas alteradas, perda da sensibilidade nos pés e nas mãos, diminuição da mobilidade, perda da função muscular, dores musculares... Nada bom. Mais ainda para quem gostaria de ficar "linda para o carnaval". 

Como eu disse lá no começo, me desculpem os nutricionistas-perfeccionistas, mas não sou mesmo contra tudo que seja diferente da nutrição mais-que-perfeita, funcional, detox, x, y, z. Gosto de praticidade, e sou honesta com a saúde. Não vejo mal em ajustar - de modo pontual, respeitoso, contido - a dieta ao seu prazer. O ponto em questão aqui é muito mais abrangente do que o usar ou não usar os queridos-shakes-substitutos-das-refeições, há se fosse "só" isso...

E mais ainda, apesar de não concordar, não julgo a atitude da jovem... Julgo a da sociedade como um todo, que acha isso um absurdo, mas vangloria uma beleza impossível. 

O que a motivou fazer isso? Por que foi essa a sua opção? Qual é a noção social que temos de emagrecimento e beleza? Que noção de felicidade é essa em que é mais importante perder 13kgs do que manter uma das necessidades mais básicas do homem? 

Só para esclarecer: "resultado" não é a perda dos quilos, é o bem-se-sentir com a sua rotina, com a sua vida e, sem dúvida (e sem hipocrisia) com seu corpo. Não é o "atingir"  o peso - não somos loja de carro, não temos metas a ser cumpridas. É o manter as conquistas e viver bem com isso. 

Claramente, não será com um "regime" como esse que teremos isso, não?


http://g1.globo.com/espirito-santo/noticia/2014/02/mulher-toma-shake-por-8-meses-e-perde-movimento-das-pernas-no-es.html



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