sábado, 2 de abril de 2016

Por dias sem culpa.

"Docinho light para comer sem culpa."
"Dicas de carboidratos para comer sem culpa."
"Lanches rápidos para comer sem culpa."
"Receitas magrinhas, gostosas e sem o peso da culpa." 
Culpa, culpa, culpa...

A indústria da dieta e suas culpas de conduta.
A publicidade-para-a-mulher e suas culpas estamparas nos corpos mais bonitos do mundo.
A conversa entre amiga e suas culpas de hoje é de ontem.
O final de semana e suas culpas continuas.

Uau... Quanta culpa! 

Quando será que instituímos que comer o que se gosta é tamanho mal, que nos sentimos culpados? (Mais ainda, que nos sentimos culpadas?) 

Será que já paramos mesmo para pensar o que é, originalmente, a culpa?
Me permita aqui - ela é, por definição, (1) responsabilidade por dano, mal, desastre causado, e; (2) falta, delito, crime.

Comer um bombom é um desastre? Tomar vinho com o esposo é um delito? O bolo de aniversário do colega no escritório é um dano? Sair da dieta é crime? Que mal todo é esse, que tanto vivemos?

Entendo que ter escolhas que não nos faz bem pode ser realmente um problema. Esquecer de tomar um antibiótico no horário, fumar, beber em excesso,  negligenciar o protetor solar, dirigir escrevendo mensagem no celular, descuidar do colesterol alto e da pressão fora do controle... Sim, de fato, podem todas serem consideradas escolhas ruins e, no limite, podem levar a culpa - e, claro, à consequências estrondosas.
Mas, sair da dieta lá e cá... Seria para tanto? Tão deletério que se revela motivo de culpa? Sério?

Creio que, no mesmo momento que abraçamos os ideias de aparência (corpo segui, slin, skinny-freak e fitness) instituímos de tabela a culpa. 

Hoje, por aqui, ela foi nivelada por baixo e todo mundo a compartilha. 

Quantas não são as vezes que escuto de um alguém querido, que se esforça lindamente para ser uma boa pessoa, mais saudável, mais disposto e mais feliz consigo mesmo a frasezinha "ah, mas aí, depois de comer, me dá uma culpa..."? 
Garanto, são muitas. E, de verdade, me parece um paradoxo constante: como se fazer mais feliz com tanta culpa? Como estar bem consigo mesmo e, ao mesmo tempo, cumprir todos os deveres (e contornos) que o mundo nos cobra?

Amiga da disciplina exagerada e do #foco, a culpa é dura, mal-educada e não pede licença. Nos põe pra baixo, nos entristece e nos desmotiva. 

Queria tanto conseguir ter uma voz persuasiva o suficiente para explicar que o corpo pouco entende algumas diferenças de consumo, que "engordamos" mais na privação do que no conforto, e que a fisiologia aceita bem as variações de rotina quando a disciplina (não exagerada) e o #foco (em ser feliz) são mais constantes que a culpa. 

Ah, como eu queria... Como eu queria dias com menos culpa. 



4 comentários:

  1. Oi Beatriz,

    primeiramente queria elogiar o teu site, nunca antes li conteúdos tão lúcidos e tão coerentes referentes à nutrição.

    Gostei tanto que li quase todas as postagens e, preciso dizer, fico aliviada de saber que existem profissionais dedicados (e pesquisadores) que pensam assim.

    O que me traz aqui e o motivo desse comentário é uma angústia pessoal...

    Há um tempo (não sei precisar quando e nem o motivo: se por questões estéticas, por saúde ou por influência da mídia) comecei a me preocupar com a minha alimentação, isto é, com o quê coloco na boca.

    Essa preocupação, voltada para saúde (e também para a estética, não posso negar) tem me levado a uma espécie de loucura, sobre, afinal: o que comer/ou que não comer? O que fazer?!?

    Na minha busca sobre o que seria uma alimentação saudável já encontrei de tudo: coma de três em três horas/ coma quando sentir fome, retire o glúten/não retire o glúten, retire o leite/não retire o leite, não beba líquido durante as refeições/beba líquido, beba 2 litros de água por dia/beba quando sentir necessidade... E por aí vai...

    Se não bastasse, como dito em diversos textos teus, o mocinho de hoje, já foi o vilão do passado (como o ovo, que foi proibido, e hoje é recomendado todos os dias; o leite, que era visto como fonte de cálcio, e hoje, fonte de infecções e inflamações)... e diversos e tantos outros produtos...

    Hoje o modismo é a retirada do glúten e da lactose, a inserção do óleo de coco e da batata doce. O veganismo, os produtos orgânicos e integrais... As cápsulas de ômega 3, a água de coco, os lactobacilos em cápsulas... Mas, eu fico me perguntando, até quando? Até que ponto? Com base em que estudos?

    Afinal, o que é ser saudável?!?

    A questão é louca, porque perpassa nós mesmos. A mídia e as sugestões vêm com tanta força, de todos os lados, que, de repente, estamos fazendo o tal do pão de queijo sem glúten e comendo aquilo como se fosse a coisa mais saudável do mundo, e, ao mesmo tempo, sentindo a tal fadada "culpa" por não comer o que é dito saudável.

    E essa "culpa" é tão forte e tão difundida que, mesmo em um momento que deveria ser de prazer (saboreando um chocolate) é praticamente impossível não senti-la...Ou pior, a sentimos mesmo comendo um alimento que talvez até seja saudável, mas que, hoje, é visto como vilão.

    Acaba que a "busca por comer bem", a "busca pelo saudável" nos consome, mais do que ajuda; nos culpabiliza, mais que conforta. Tudo o que comemos acaba parecendo "errado", "inapropriado", "não saudável". E às vezes, o que deveria ser prazer vira obrigação...

    Enfim, tudo isso para perguntar, o que, afinal, consideras uma ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL? :)

    De que forma uma alimentação saudável pode nos ajudar? :)

    E se, no meio de tantos modismos, existem alimentos que, de fato, sempre serão vilões e sempre serão mocinhos? :)

    Em outras palavras: se o meu objetivo é me alimentar bem, nutrir meu corpo, respeitar meus impulsos e o meio em que vivo e, também, a preocupação com o peso (sei que não gostas desse tipo de preocupação, baseada em padrões em impostos, mas ele existe em mim e é quase incontrolável) como agir? Ou, talvez, como não agir?

    Obrigada!

    Att,.
    Juliana

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