sexta-feira, 27 de março de 2015

Barriga-grávida-definida: uma breve consideração.

Desde que vi a primeira foto – a Sarah Stage de barriga-grávida-definida, de calcinha, em uma selfie no espelho – fiquei inquieta, naquela angústia que normalmente me motiva a escrever. Iniciei o texto muitas vezes. Mas nunca cheguei ao fim. Busquei mais fotos, vi “notícias” a seu respeito, li e re-li os comentários e, apesar de permanecer inquieta, não sabia exatamente aonde meus pensamentos ancoravam.

Eis que passou um tempinho, e me deparei com a foto da Bella Falconi grávida – de perfil, exibindo, também de calcinha, uma barriga -grávida-definida em mais um selfie de espelho. Na mesma angústia, busquei mais informações, vi mais fotos, li os comentários e tudo-o-mais. Neste exercício de busca notei que a verdadeira angústia – diferente do que retratado nos comentários – estava justamente neles, no impacto que as tais fotos haviam causado.

Dentre os comentários, consegui notar três espectros diferentes: (1) aqueles que criticavam, afinal “naquela barriguinha o neném deveria estar espremido”; (2) aqueles que criticavam quem criticava, sob o argumento de que “se ela está saudável ok”, e “quem critica é recalcado”, e; (3) os elogiadores comedidos, que aplaudiam a exposição feminina.

Isto posto, notei que a problemática real não está na conduta, mas na exposição.
Não está na escolha pessoal, mas no exemplo.
Não está na mulher (em si), mas no que se espera dela.
Não está na fotografia, mas no contexto.
Não está na crítica nem no “recalque”, está no narcisismo e na qualidade de capital que o corpo tem.


Na bem da verdade, o que deveria importar mesmo é a saúde (da mãe, da criança, da sociedade) e a felicidade (da mãe, da criança, da sociedade), mas preferimos nos aprisionar em um moralismo de exposição – que é tão de fachada quanto uma selfie de calcinha no espelho. 


terça-feira, 24 de março de 2015

Bem Estar, campanha #afinarocha e o desserviço social.

Nesta segunda-feira, 23/3, o tema "principal" do conhecido programa abordou a perda de peso de um de seus apresentadores. 
Dentre os comentários e as "matérias" a seu respeito, eis que surge a figura da profissional que o acompanhou (uma colega de área, uma nutricionista) e, claro, traços da conduta nele aplicada.

Pois então... 
Novamente o emagrecimento, novamente a perda de peso, novamente as calorias... Não que seja um assunto velado - utopia que estamos bastante distante - mas será mesmo que é preciso que ele esteja tão em pauta? Que sejam tópicos tão frequentes? Será que isso ajuda mesmo a população a se conscientizar? Será que não promove, do modo com que é apresentado, ainda mais malefícios do que benefícios? 

Estão aí perguntas que (além de terem motivado minha dissertação de mestrado em 2013), creio que pouco teremos consenso nas suas respostas.

Mas... Isso não nos impede de questionar sempre que temos a chance. Não é mesmo? O conteúdo virou (nacionalmente) público, então podemos fazê-lo sem pedir licença.

A seguir então, algumas considerações: (vale lembrar que considerações não são acusações, tão pouco julgamentos.) :)

1-) Nosso corpo não é máquina. É afinado, alinhado e nos responde bem frente a estímulos, mas não é máquina... O pensamento biológico não é mecanicista. 
Me parece esquisito (para não dizer um pouco ultrapassado) uma orientação dietética ser baseada em calorias. Índice (na verdade carga) glicêmico(a), tudo bem, é lindo... Mas é mesmo que de 4000 passou-se a 800kcal/dia? É mesmo? Mesmo? Isso não vai bagunçar ainda mais esse metabolismo? Será que ele não ficará mais baixo, mais preguiçoso? Será que essa dieta não terá um platô próximo? Daqueles bem difíceis de sair? ... Mais ainda, será que é prudente expor, em rede nacional, que uma nutricionista assume uma dieta de "poucas calorias" para um homenzão daquele? Será que foi considerado que o programa passaria em televisões de pessoas bem esclarecidas, e outras nem tanto? Será que foi considerado que quase todas as pessoas são capazes de contar calorias? Será que lembraram que nutrição é uma ciência séria que não é "só" contar calorias, mas que ao "ensinar" a conduta, acaba dando o aval para ser reproduzida? Será que não consideraram o impacto em grande escala que isso poderia causar? Hum...

2-) A classe de profissionais da nutrição é complicada. Não apenas os nutricionistas, mas os nutrologos e os endocrinologistas e todo o aparato técnico que se "prepara" para trabalhar na aérea. Não à toa temos tantos problemas com dissonância de condutas (muito embora eu, particularmente, as perceba de modo positivo - tem nutricionista para tudo que é gosto!). No programa, no entanto, qual foi a atuação/atitude da colega? Mandona, né? Será que isso depõe à favor? Será que é este mesmo o modelo (que respeita o estereótipo) que queremos ter? Será que bem nos representa? No limite, será que é possível representar uma classe tão plural? Pensando novamente em grande escala, será que foi uma boa propaganda para nutricionistas de todo país? (Será que somos assim na maioria?). Não pareceu que somos fiscais-do-comer? Eu hein...?

3-) No modo com que foi apresentado - o prato-de-comida-que-só-tinha-salada e a dificuldade-da-privação-dos-eventos-sociais - a dieta pareceu dura. Daquelas que prega mesmo o modelo mecanicista de cálculo de comida e desconsidera a vida do paciente/cliente. Será que, para emagrecer, é preciso tirar da vida tudo o que se gosta? Será que temos resultados bons (fiéis, duradouros, reais...) assim? Será que o cidadão que segue, no intuito de perda de peso, aceita ser infeliz? Se privar de tal modo? Mais ainda, e voltando ao profissional, será que é isso que queremos "vender"? De novo, será que foi essa uma boa publicidade? Será que isso encoraja pessoas a buscarem novos hábitos de vida? Ou será que "o saudável" pareceu ainda mais distante "do real"? Será que (nós) temos o direito de mexer de tal modo na vida do outro? Será que merecemos ser taxadas deste modo?  Não sei não... Não gostei dessa ideia não...

4-) #afinarocha - "campanha" em prol do emagrecimento do apresentador: 21kg em 2 meses. É isso mesmo? É sério? Campanha para o emagrecimento acelerado...? Que expectativas isso gera? Qual o benefício real nisso tudo? Uma campanha? Com hashtag e tudo? Esta bem.

É uma pena. 
Eu lamento muito.

O que me entristece, além da contra-propaganda e da promoção errada do conceito da profissão é, principalmente o mau uso da informação pública. Com a abrangência que se tem, vestidos de "doutores" (com a chancela de "qualidade" da emissora) propagam valores que se vendem em troca de audiência... Isso tudo em uma sociedade já cheia de problemas ligados à alimentação: quer sejam pelo seu excesso, quer sejam pelas restrições. 




http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2015/03/fernando-rocha-encara-dieta-para-emagrecer-ate-21-kg-em-dois-meses.html

terça-feira, 3 de março de 2015

Dietas-da-moda? Responsabilidade é a resposta.

Nessa última semana, talvez por conta do insultante assunto da "dieta do jejum" da Vogue, as tais-dietas-da-moda se fizeram ainda mais presentes.

Tive a oportunidade de ler vários comentários a respeito das mais variadas versões, dos seus adeptos e dos desencorajados... Aqui, de fora da discussão, e conhecendo um pouco mais de bioquimica, fisiologia e metabolismo do que os discutidores do assunto, eu fiquei aflita. Muito aflita.

Veja bem, em momento nenhum me coloco como sabe-tudo e, mesmo sendo muito apaixonada pela minha prática diária e pela ciência que considero muito séria, eu não questiono os resultados (nem os motivos que levaram a alguém fazer ) qualquer que seja a moda dietética do momento. 

Não julgo, sobretudo, porque existe uma importante individualidade metabólica, que resguarda a cada um, resultados diferentes, de acordo com praticas também diferentes de vida. 

Não julgo também a angústia que temos para ter/fazer/conquistar um corpo ideal - isso é muito mais profundo do que parece e, ao meu ver, é um sintoma clássico de uma sociedade de valores atrapalhados, imersa na estrutura do consumo (mas isso é assunto para outro momento). 

O que quero dizer, na verdade, é que a dieta-da-moda, seja ela qual for é, já no seu conceito, algo falho. Nela está embutido um preceito de "momento" que vem e vai, que fará "sucesso" por dado período, que encantará quem a seguir, até que perderá sua luz. Do seu enfraquecimento, vem o efeito rebote e estamos cá na estaca zero. 

Só a título de curiosidade, a palavra dieta, enquanto origem, significa nada mais nada menos do que estilo de vida. Então, quando alguém diz que está em uma "nova dieta", o que isso implica realmente é em uma "nova tentativa de levar a vida". 

Eis então o coração da questão que trago aqui: então quer dizer que seu novo estilo de vida é se privar? É se alimentar apenas de proteínas? É contar pontos de calorias dos alimentos? É, no extremo da impraticabilidade, viver no jejum?

Meus caros, honestamente, sem problemas. (E, por favor, que isso não seja lido com tom irônico!)

Se essas propostas bem lhe servem... Se crê que é válida a tentativa, pois bem, que a siga. Quem somos nós para julgar e mandar no estilo de vida do outro? 

O que acho importante frisar, é que toda escolha implica em conseqüências, de tal modo que me parece óbvio dizer que então, cada nova tentativa de controle do corpo (e do estilo de vida) precisa ser realizada de modo responsável. Daí a necessidade de conhecer os impactos (momentâneos e futuros) da conduta escolhida.

Essas explicações, muitas vezes difíceis de serem formuladas, buscam sua origem no modo de funcionamento do corpo e no seu alinhado balanço de energia que, sobretudo, privilegia a vida. 

Pois é, o homem contemporâneo tem, na verdade, um corpo bicho. 

Esse, por sua vez, não aceita desaforo e sabe que, na verdade, quem manda em você é ele e não o contrário.

Nesse pensamento, creio que não custa saber - de fontes confiáveis - aquilo que acontece com o corpo quando se propõe mudanças de estilo de vida (lê-se dietas). 

 O resultado de hoje e de amanhã nada se compara com o eco metabólico que pode ser sentido por anos. Ponderação e conhecimento podem ser grandes aliados à tomada de decisões que podem parecer bobas e pequenas - afinal temos tantas dietas da moda e tantas pessoas às executam - mas podem mexer em um mecanismo perfeito e tirá-lo do eixo! 

Responsabilidade é então a palavra. 

Não apenas na escolha da conduta que optamos para conquistar nossos objetivos, mas também como determinante da nossa felicidade - vai me dizer que comer não é gostoso e não nos deixa felizes? 

Sei que me repito nesse tópico, mas já que é para escolher uma nova dieta (um novo estilo de vida), que essa seja para te deixar feliz! 
Não?